Era uma vez uma lagarta. Se esgueirava pelos cantos tentando não ser pisada. Lagartas não podem voar. Era só o que ela sabia. Mas alguma coisa dentro da lagarta dizia: "E como seria se eu pudesse"? Ela queria, mas parece que não era coisa da sua natureza. Pelo menos era o que diziam. Ficou só no sonho mesmo. Na imaginação...
O tempo foi passando e a lagarta fazia o que podia pra chegar a tempo nos lugares, mas era sempre a última a ser escolhida. Criada em um lar tradicional de lagartas, aprendeu a nem se esforçar muito pra chegar junto por que lagartas sempre ficam pra trás. Melhor nem sair do lugar. Mas a lagarta sempre se perguntava: "Por que mesmo estão todos correndo?"
De repente, em um dia como qualquer outro, sem mais nem menos, a lagarta teve que sair de casa. Parece que é coisa de lagarta, mas ninguém falava sobre isso. A lagarta já tinha ouvido falar dessa tal partida mas achou que era lenda. Achou que acontecia só em filme de cinema.
E assim, do dia pra noite teve que aprender a se virar sozinha. Segundo a lenda, as lagartas tem que procurar um lugar seguro por conta própria e endurecer sua carcaça. Ninguém falava disso direito, mas toda lagarta precisa se transformar um dia.
E assim foi pra essa lagarta. Despreparada, com ritmo próprio e um pouquinho curiosidade no bolso, a lagarta teve que parar a vida toda e enrijecer sua couraça. Se fechou na capa que já ia engrossando e ficou dias lá dentro. Na verdade tinha momentos que nem sabia mais se era dia ou noite ou se estava fazendo a coisa do jeito certo. Muitas vezes perguntou se valia a pena mesmo esse processo. -- "Será que não era melhor ser lagarta o resto da vida?" -- As vezes pensava que não era ruim ficar pra trás.
Mas quando se dava por si percebia que não tinha mais como voltar atrás. Já não se sentia mais lagarta, mas também não sabia o que era. Até que cansada da espera pegou no sono. Resolveu deixar rolar...
No que pareceu um segundo, abriu os olhos e viu uma luz. Será que tinha morrido de tanto esperar? Coçou os olhos e sentiu um peso nas costas. De repente percebera que agora tinha bracinhos e perninhas. Ficou surpresa e começou a se mexer. Pouco a pouco aquele casulo apertado foi se quebrando em pedaços e de repente a lagarta se viu na beira de um rio. Se olhou no espelho d'água e chorou.
-- "Que asas mais lindas! Também muito pesadas..."
Era o peso de não ser mais lagarta. Só que agora podia voar...
